Lembro-me exactamente das circunstâncias em que eu lia aquele livro. Eram sempre as mesmas: quando não me deixavas fazer o que queria, quando me mostravas que eras tu que ainda decidias o que era melhor ou pior para mim, quando fazias valer a tua idade e experiência, mostrando-me o caminho e abrindo os meus horizontes. Ainda assim, a última palavra era sempre a tua.
Já naquela altura eu tinha uma tremenda dificuldade em mostrar a minha obediência, o acatar de decisões que não dependiam da minha, mas sim da vontade de outros.
O livro falava de uma menina que ia a um qualquer evento social com os pais. Naquela noite, a menina tinha encontrado umas plumas escarlate e ia levá-las ao tal evento quando a sua mãe, achando o acessório inapropriado, a advertiu e disse-lhe que ela não levaria as plumas. A obediente criança assim o fez, pois a sua mãe advertiu-a de que ela era ainda demasiado nova para tomar decisões e ela deveria obedecer. Nessa mesma noite, a mãe da menina escolhera uma vestido bonito e quem sabe até ligeiramente ousado. Ao ver a sua esposa, o marido chamou-lhe a atenção de que talvez o vestido fosse algo inapropriado para o serão. A mãe ostentou o vestido na mesma.
De volta do tal evento, a mãe ficou pensativa e chegou à conclusão de que talvez tivesse exagerado ao proibir a pequena de levar as plumas escarlate, quando ela tinha vestido um vestido para o qual lhe tinham chamado à atenção de que talvez não fosse o mais adequado para a circunstância. A mãe dirigiu-se à sua pequena filha e pediu-lhe desculpa pela sua atitude, prometendo-lhe que de futuro a sua filha já poderia tomar as suas decisões, claro está com a sua supervisão e conselhos. A menina já tinha idade suficiente para assumir a responsabilidade dos seus actos, a mãe guiá-la-ia todavia, estaria sempre presente para apoiá-la e certamente redobraria esse seu apoio nas alturas em que as consequências das decisões daquela menina, não fossem as mais positivas.
Às vezes apetece-me ir procurar esse livro, mas depois olho para nós e vejo que nunca vamos ter solução. O choque das nossas personalidades iguais é demasiado grande, para um dia desaparecer. O objectivo não passa por exterminá-lo, mas sim minimizar o seu impacto.